quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Uma visão Psicanalítica sobre o Acidente Aéreo e o Tabu da Morte





Todo mundo vivenciou uma comoção nacional em função do acidente aéreo que vitimou a equipe de futebol da Chapecoense, além de jornalistas conhecidos. A internet "parou", programas de TV mudaram sua programação para noticiar e debater sobre o ocorrido. Até nas ruas se ouvia comentários. Qual a nossa análise psicanalítica sobre toda essa reação emocional ?

A nossa sociedade ocidentalizada, escravizada pelo ego, não sabe lidar com a morte, com a ideia de que a nossa fugaz existência terá inexoravelmente um fim. Essa questão é um tabu. O ego enxerga a morte como uma perda e ele, definitivamente, não sabe perder. Como estratégia, induz o indivíduo a uma busca pela imortalidade no refúgio e conforto ilusório das religiões ao mesmo tempo em que ativa o mecanismo de defesa da "repressão" o qual tira da consciência todo desconforto, medo, ideia, lembrança, representação sobre a morte evitando reações neuróticas. Se não usássemos a repressão, uma provável ideação mórbida e um sentimento de vulnerabilidade permeariam nossa consciência o tempo todo e provocariam reações mal adaptativas. Imagine acordar todos os dias e começar a pensar : "será que vou morrer hoje ? A repressão, portanto, ajuda a nos livrar desses neuroticismos entretanto, como consequência, nos faz esquecer do quão frágil, efêmera e vulnerável é a nossa vida e que vivemos numa contagem regressiva existencial. Tomamos decisões e fazemos escolhas que talvez não fizéssemos caso tivéssemos uma consciência mais equilibrada e madura sobre nossa própria finitude. Uma outra consequência da repressão é que, quando há um fato chocante e inesperado, como neste caso do acidente aéreo, a dramaticidade da situação faz romper esse mecanismo psicológico colocando na consciência todo volume reprimido mal digerido e elaborado sobre a morte, trazendo a reboque uma gama de sentimentos confusos e desestruturados. É a explicação para toda essa comoção e reação quase catártica. De repente, num rompante inesperado, a morte passa de um conceito ou ideia longínqua, para uma representação muito próxima, viva, tangível, real e todo esse processo assusta e fragiliza.

Esse sentimento de "solidariedade" diante da catástrofe é mais um subterfúgio do ego, uma transferência das nossas fragilidades, medos recalcados e negados, agora emergidos, do que propriamente uma manifestação espontânea de empatia com os que morreram. Mesmo assim, esse estado não dura muito tempo. Logo o mecanismo da repressão irá agir novamente em conjunto com outros mecanismos como a racionalização e começaremos a sentir um certo alívio, uma "felicidade agridoce". As pessoas se darão conta de que elas estão vivas, sãs e salvas e o processo de repressão será ativado gradualmente. O resultado são aquelas mensagens clichês tais como; "precisamos viver o presente", "o amanhã é o agora" e coisas desse tipo. Em seguida, numa terceira fase, o medo da morte é novamente recalcado, a vida segue o seu fluxo e nos comportamos como se nada tivesse acontecido (exceção para os parentes e pessoas próximas das vítimas). Agiremos da forma "padrão"; como se fôssemos poderosos, imortais e atemporais, até o próximo desastre.

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