quarta-feira, 30 de novembro de 2016
Uma visão Psicanalítica sobre o Acidente Aéreo e o Tabu da Morte
Todo mundo vivenciou uma comoção nacional em função do acidente aéreo que vitimou a equipe de futebol da Chapecoense, além de jornalistas conhecidos. A internet "parou", programas de TV mudaram sua programação para noticiar e debater sobre o ocorrido. Até nas ruas se ouvia comentários. Qual a nossa análise psicanalítica sobre toda essa reação emocional ?
A nossa sociedade ocidentalizada, escravizada pelo ego, não sabe lidar com a morte, com a ideia de que a nossa fugaz existência terá inexoravelmente um fim. Essa questão é um tabu. O ego enxerga a morte como uma perda e ele, definitivamente, não sabe perder. Como estratégia, induz o indivíduo a uma busca pela imortalidade no refúgio e conforto ilusório das religiões ao mesmo tempo em que ativa o mecanismo de defesa da "repressão" o qual tira da consciência todo desconforto, medo, ideia, lembrança, representação sobre a morte evitando reações neuróticas. Se não usássemos a repressão, uma provável ideação mórbida e um sentimento de vulnerabilidade permeariam nossa consciência o tempo todo e provocariam reações mal adaptativas. Imagine acordar todos os dias e começar a pensar : "será que vou morrer hoje ? A repressão, portanto, ajuda a nos livrar desses neuroticismos entretanto, como consequência, nos faz esquecer do quão frágil, efêmera e vulnerável é a nossa vida e que vivemos numa contagem regressiva existencial. Tomamos decisões e fazemos escolhas que talvez não fizéssemos caso tivéssemos uma consciência mais equilibrada e madura sobre nossa própria finitude. Uma outra consequência da repressão é que, quando há um fato chocante e inesperado, como neste caso do acidente aéreo, a dramaticidade da situação faz romper esse mecanismo psicológico colocando na consciência todo volume reprimido mal digerido e elaborado sobre a morte, trazendo a reboque uma gama de sentimentos confusos e desestruturados. É a explicação para toda essa comoção e reação quase catártica. De repente, num rompante inesperado, a morte passa de um conceito ou ideia longínqua, para uma representação muito próxima, viva, tangível, real e todo esse processo assusta e fragiliza.
Esse sentimento de "solidariedade" diante da catástrofe é mais um subterfúgio do ego, uma transferência das nossas fragilidades, medos recalcados e negados, agora emergidos, do que propriamente uma manifestação espontânea de empatia com os que morreram. Mesmo assim, esse estado não dura muito tempo. Logo o mecanismo da repressão irá agir novamente em conjunto com outros mecanismos como a racionalização e começaremos a sentir um certo alívio, uma "felicidade agridoce". As pessoas se darão conta de que elas estão vivas, sãs e salvas e o processo de repressão será ativado gradualmente. O resultado são aquelas mensagens clichês tais como; "precisamos viver o presente", "o amanhã é o agora" e coisas desse tipo. Em seguida, numa terceira fase, o medo da morte é novamente recalcado, a vida segue o seu fluxo e nos comportamos como se nada tivesse acontecido (exceção para os parentes e pessoas próximas das vítimas). Agiremos da forma "padrão"; como se fôssemos poderosos, imortais e atemporais, até o próximo desastre.
terça-feira, 22 de novembro de 2016
Curando a Vaidade Neurótica
Parte da nossa sociedade é obcecada por imagem, "por ficar bem na foto" e, como resultado, julga pelas aparências. Esse padrão nada mais é do que um reflexo da baixa autoestima crônica que força o indivíduo a buscar reconhecimento e aprovação. Ser como é não parece suficiente. É preciso ser "algo a mais" e para isso há uma busca neurótica por reconhecimento, admiração, validação e aprovação dos outros. Como combater essa neurose ? Se comportando conscientemente no modo oposto ao padrão. Buscando ser o mais autêntico, verdadeiro, simples e transparente possível. Não negar fracassos, fraquezas, limitações ou imperfeições e não cair na tentação de buscar essa validação. É como um vício. Da um sensação gostosa. Esse prazer é o que chamamos de "ganho secundário". Conseguir superar e viver sem essa tentação, sem esse ganho secundário é a chave para a quebra do padrão e consequentemente a cura. O ego é ardiloso e pode disfarçar a vaidade fazendo-a parecer uma virtude. Tem gente que é super vaidosa e orgulhosa bancando a humilde, solidária ou prestativa. Tem gente que é vaidosa bancando a ponderada, tolerante ("não discuto, não entro em conflitos nem me meto em polêmicas"). A vaidade pode se esconder nas atitudes (muitas vezes sutis) e não apenas nas aparências. Quando começar a sentir aquela tentação de se valorizar (ganho secundário), desperte e mate o ego de fome; quebre o padrão com raiva, energia. Sinta o desconforto. Em geral sente-se uma tristeza, uma mágoa, vergonha ou uma sensação de apequenamento e humilhação. Aguente firme porque a cura virá com consciência, persistência e consistência. Se sentir abstinência do ganho secundário, procure ajuda psicoterápica.
Relação Terapêutica
Relação terapêutica não significa ser cúmplice ou "amiguinho" do consulente, muito pelo contrário. Relação terapêutica significa que o consulente enxergará no terapeuta a figura do adulto saudável que ele, consulente, nunca teve dos seus cuidadores e também nunca desenvolveu internamente. Isso significa que muitas vezes o terapeuta imporá limites ao comportamento do consulente. O principal ingrediente dessa relação terapêutica é a compreensão empática e neste aspecto, a ACP (abordagem centrada na pessoa) de Carl Rogers, é muito útil e pode servir como diretriz e plano de fundo. Uma questão é certa: as necessidades emocionais não atendidas ou frustradas somente conseguirão ser reparadas e curadas ao longo das sessões mediante o fortalecimento da relação terapêutica. Nenhuma técnica psicoterápica conseguirá. Eu diria que a principal causa de um fracasso da terapia ou evasão do consulente tem a ver com a falta de empatia nessa relação terapeuta-paciente. E digo mais; essa falta de empatia com o paciente e vice-versa tem como causa os esquemas do próprio terapeuta que foram ativados durante as sessões, os quais sabotaram e inviabilizaram a terapia. Mas essa questão será abordada em outro post.
sábado, 19 de novembro de 2016
Inibição Emocional
Uma grande parte dos homens tem esquema de inibição emocional que os fazem reprimir e se distanciar das próprias emoções. O nível de maturidade emocional desses indivíduos é de uma criança. O comportamento se torna frio, distanciado, rígido, pouco empático e "racional demais". Aprendem inconscientemente a usar com maestria vários mecanismos de defesa como a negação, repressão, deslocamento, racionalização, projeção, formação reativa, resistência, somatização, supressão ... o uso desses mecanismos vai depender da situação, juntamente com o temperamento e a personalidade. Esse esquema de inibição emocional reflete uma necessidade emocional não atendida de apoio e acolhimento. Os pais pareciam distantes, frios, controlados. A criança não se sentia acolhida emocionalmente. Aprendeu a "engolir o choro" e a lidar internamente com o sofrimento, angústias, medos e conflitos. Aprendeu que sentir e demonstrar emoções é sinal de fraqueza ou inadequação. A nossa cultura machista reforça essa condição ("homem não chora, tem que ser durão"). Como aprenderam a não identificar nem lidar com as próprias emoções, estas são vistas como inimigas, algo a ser evitado, uma criptonita que enfraquece o "Super Homem". Quando um homem com inibição emocional libera as suas emoções reprimidas numa sessão, ele se desmancha, há uma catarse, um choro reprimido há décadas. Um cliente meu de 54 anos chorou de soluçar por mais de 30 minutos e disse que a última vez que chorou tinha sido aos 11 anos quando foi morar na casa dos avós se sentindo rejeitado pelos pais que escolheram cuidar apenas dos seus irmãos gêmeos. Quem tem esquema de inibição emocional trabalhado e desconstruído aprende a identificar, entrar em contato e manejar suas próprias emoções. O resultado é uma mudança quase que radical na visão de mundo, valores, cognição, com reflexos diretos no comportamento. Há uma transformação muito positiva, saudável e marcante, mas que precisa ser acompanhada pelo psicoterapeuta. É como um renascer.
segunda-feira, 14 de novembro de 2016
Demonstração prática, verdadeira e explícita do complexo de Édipo
É nesta fase que a criança começa a estruturar seus esquemas do domínio de "DESCONEXÃO E REJEIÇÃO" relativos aos relacionamentos afetivos. Caso haja abusos, negligências ou ambiguidades por parte da mãe nesse "caso de amor ", o menino pode fazer esquemas de abandono e defectividade, se tornando um adulto inseguro, ciumento e possessivo. O mesmo se sucede em relação às meninas, no caso, o "complexo de Electra". A menina se "apaixona" pela figura masculina do pai. Um pai ausente, abusivo, fraco ou negligente causará uma ferida emocional que se refletirá nos relacionamentos afetivos. A mulher pode se tornar uma viciada em amor; uma codependente. Sua necessidade emocional de sentir-se plenamente amada pelo parceiro parece que nunca é saciada.
quinta-feira, 10 de novembro de 2016
Terapia do Esquema = Trabalho com "Modos"
Terapia do Esquema = Trabalho com "modos". Eu insisto muito nisso porque é o que se convencionou pelo próprio Jeffrey Young já desde 2008. Não se trata os esquemas individualmente. Um esquema nuclear pode ter (em geral tem) vários esquemas subjacentes atrelados a ele num efeito cascata e ainda com vários estilos de enfrentamento distintos, portanto, tratar esquemas isoladamente se mostrou inviável, logo, a Terapia do Esquema implica em trabalhar com modos. Um erro muito grave de conceito, mas bastante comum que eu vejo por aí é tratar esquema com se fosse uma crença. Esquema é basicamente "memória emocional" que fica registrada, "inflamada" na amígdala, na região do hipocampo no sistema límbico. O paciente simplesmente reage ao gatilho do esquema e nem sabe porque. Ele não tem controle nem consciência alguma sobre isso. Não adianta pedir para ele descrever os" pensamentos automáticos". Não funciona desse jeito. O paciente sente os efeitos do esquema e pronto ! O objetivo da Terapia do Esquema é justamente reparar esse "trauma" (as reações aos esquemas ativados se assemelham à traumas) fazendo a reparação parental, REESTRUTURANDO EMOCIONALMENTE o paciente, dando a ele o que ele nunca teve dos pais ou cuidadores, além de rever e "macerar" toda sua história afetiva e emocional. Também são criadas novas sinapses que permitirão ao paciente controlar conscientemente suas respostas aos esquemas ativados não mais através da amígdala, mas pelo córtex pré frontal. O trabalho com modos simplifica e torna tudo isso bem mais manejável e mensurável. Mas o que eu quero mais salientar é que a Terapia do Esquema (trabalho com modos) pode e deve ser aplicada em QUALQUER hipótese diagnóstica, das mais simples aos casos mais complexos. O terapeuta do esquema tem um leque, um arsenal terapêutico e uma flexibilidade de atuação que é muito efetivo e superior. Quem adota a Terapia do Esquema como linha de trabalho sente-se preparado para enfrentar qualquer paciente em qualquer condição.
sábado, 5 de novembro de 2016
O retrato de um NARCISISTA
Como se comporta uma pessoa que tem os seguintes esquemas resignados: Arrogo/Grandiosidade, Inibição Emocional, Reconhecimento/ Aprovação e Postura Punitiva ? Resultado : Transtorno de Personalidade Narcisista.
quinta-feira, 3 de novembro de 2016
Ego e realidade são incompatíveis
A nossa "personalidade" ou "ego" é uma máscara que usamos (inconscientemente) para lidar e interpretar subjetivamente uma realidade que é OBJETIVA E NEUTRA. Quando nos identificamos com o ego o resultado é um só : sofrimento. Sofremos porque a realidade quase nunca "bate" com as interpretações, expectativas e desejos dele. O ego nos faz interpretar e interagir com uma realidade que não existe. Somos iludidos e enganados o tempo todo. A solução seria nos livrarmos dele, mas a maioria faz justamente o oposto; se apega ainda mais e decide entre fugir, negar ou brigar com a realidade. O resultado é ainda mais sofrimento.
terça-feira, 1 de novembro de 2016
A Terapia do Esquema na Depressão
Olá, seja bem vindo ao meu blog Terapia Intensiva. O assunto de hoje é a Depressão. A abordagem desse artigo será sob a ótica da minha especialidade: A Terapia do Esquema.
A despeito de existirem várias classificações de depressão, vou me fixar no meu ponto de vista acerca do tema onde os esquemas assumem um papel crucial e determinante.
Eu classifico basicamente a depressão em três vertentes : a depressão crônica, incapacitante, onde a pessoa já tem um histórico depressivo ao longo da vida, a depressão ocasional, "factual", engatilhada por uma circunstância externa, um fato ou uma experiência difícil de assimilar, entender, aceitar ou digerir emocionalmente, a pessoa da uma "balançada", há uma limitação psicológica momentânea que provoca a depressão, mas que, num tempo relativamente curto, no máximo em 3 meses, ela já começa a se recuperar e o mais importante, ela não tem recaída, o que passou, passou. E tem a distimia, que vem a ser uma alteração crônica de humor, onde a pessoa não necessariamente fica incapacitada, mas a qualidade de vida dela é afetada por essa condição distímica.
Tanto na depressão crônica como na distimia pode existir, muito provavelmente, uma comorbidade de natureza psiquiátrica, um desequilíbrio bioquímico cerebral, mas vou focar esse artigo, como já me referi, às causa psicológicas sob o ponto de vista da Terapia do Esquema.
A depressão crônica, onde o período depressivo em geral é extenso (mais de um ano com oscilações de intensidade), o indivíduo tem um histórico de quadros depressivos ao longo de toda sua vida, começando na infância, se intensificando na adolescência e passando a ser crônica na vida adulta, com raros períodos de intervalo, mas oscilando entre um quadro forte, incapacitante, até com internação, com períodos melancólicos em que não há necessariamente prejuízo funcional. Pode ocorrer, em casos de transtorno bipolar ou de personalidade borderline e até na esquizofrenia, uma condição em que as depressões crônicas surjam com mais intensidade já na vida adulta, em ciclos e atuando em comorbidade com as "viradas maníacas" (períodos de euforia), mas eu, particularmente, questiono essa premissa. Penso que nestes casos esses pacientes já apresentavam quadros depressivos e viradas maníacas na infância, mas que, provavelmente, foram subdiagnosticados ou subtratados.
Alguns classificam a depressão crônica como puramente biológica, no que eu também discordo. Mesmo que a causa primária seja efetivamente um desequilíbrio bioquímico cerebral, vai ocorrer a mesma situação como na ansiedade; independente desse desequilíbrio nos neurotransmissores ser uma herança genética ou uma doença congênita, esse quadro acaba se tornando um dos fatores decisivos na formação dos esquemas, ou seja, de qualquer forma, a criança que nasce com esse desequilíbrio bioquímico sofre influência dessa morbidade na construção da sua personalidade e temperamento. No caso do ansioso, ele se torna uma pessoa de personalidade fóbica e no caso do deprimido, a personalidade fica toda estruturada num padrão emocional melancólico.
Existem três esquemas que, ativados juntos, reforçados pelo temperamento, o qual determina o estilo de enfrentamento desses esquemas, provocam um quadro de depressão crônica e profunda; senão, vejamos: esquema de negativismo/pessimismo, onde a visão de mundo e de futuro é muito negativa e limitada. Esse esquema da uma sensação permanente de que nada vai dar certo, está tudo muito ruim e sempre estará. Não há esperança; esquema de defectividade, onde se concentra a chamada "baixa autoestima" e a autoimagem negativa. A pessoa com esse esquema nutre um sentimento de que é falho, sem valor, algumas vezes desprezível, podendo se sentir um "lixo"e por fim o esquema de privação emocional, onde há, inconscientemente, uma certeza de que não se é querido, não se é amado por ninguém e que ninguém se importa.
Na depressão "ocasional" ou "factual" pode acontecer da pessoa ter um desses esquemas o que já é condição suficiente para se deprimir (imagina com três esquemas ao mesmo tempo ! ), por exemplo, ela tendo um esquema de defectividade, ocorre um rompimento de relacionamento que ativa e intensifica sua baixa autoestima. Se tiver um temperamento melancólico e consequentemente uma resposta resignada, vai sofrer bastante, ficar na "fossa" e levar mais tempo para se recuperar, mas conseguirá se recuperar. Provavelmente precisará de ajuda psicoterápica para superar esse momento, mas mesmo que isso não aconteça, conseguirá se reerguer desde que não tenha os demais esquemas que formam a equação depressiva crônica. Na depressão ocasional a pessoa, a despeito de ficar bem abalada, não fica incapacitada. Consegue trabalhar (mal, mas consegue), se mantém relativamente funcional. Geralmente leva um mês ou 40 dias para começar a se recuperar. Passou de 40 dias e não se recuperou ou pelo menos começou a melhorar, deve se acionar o alerta para monitorar esse quadro depressivo. Se passar de três meses é necessária uma outra avaliação. Vale lembrar que nesses casos de depressão ocasional, a pessoa sai do quadro depressivo, mas ainda pode ficar "machucada" e a cicatrização pode levar anos, tal qual um processo de luto.
Quem tem os três esquemas (privação emocional, defectividade e pessimismo/negativismo) já tem histórico de depressões longas e fica extremamente suscetível a ter recaídas. A pessoa consegue se recuperar por algum tempo depois de um longo período depressivo, mas retorna ao quadro de depressão porque o padrão, o "normal" é ficar deprimido. Na verdade, esse período de recuperação é enganoso e passageiro, é apenas um intervalo entre uma fase depressiva e outra. Não representa uma melhora. A cura só virá quando forem tratadas as feridas emocionais que criaram os três esquemas, fora isso, tudo será apenas paliativo.
Existe uma outra condição depressiva que é chamada de "distimia". A distimia também é uma depressão crônica, mas com algumas diferenças. A pessoa distímica em geral não tem o esquema de defectividade, portanto, a sua autoimagem é relativamente boa. Na verdade, o distímico pode ter como esquema nuclear principal o negativismo/pessimismo. O que falta ao distímico é ESPERANÇA e CONFIANÇA no futuro e nas pessoas. Ele confia nele. Acha que o mundo funcionaria melhor se existissem pessoas com a mentalidade dele. Uma curiosidade é que o temperamento do distímico em geral não é melancólico. Ao invés de tristeza, o que ele nutre e sente na verdade é raiva na forma de ressentimento, intolerância, crítica e impaciência. Enquanto que o depressivo crônico acha que o mundo seria melhor sem que ele existisse, o distímico acha que ele ficaria melhor se todos sumissem do mapa. A culpa é dos outros, os outros é que enchem o saco dele. Essa visão de mundo denota um esquema de isolamento social ("não me encaixo nesse mundo nem me identifico com ninguém"), padrão inflexível (perfeccionismo) e inibição emocional ( falta de empatia com os outros).
O distímico é antes de tudo um mal humorado, ranzinza, azedo, amargo, um chato de galocha. Ele sofre ? Claro que sofre. Mas o sofrimento é reprimido, além dele hipercompensar e inverter o jogo. Ele provoca (projeta) nos outros os sofrimentos dos esquemas dele. O seu temperamento agressivo o ajuda a hipercompensar se colocando no polo oposto aos seus esquemas o que o faz se distanciar deles, mas ao mesmo tempo em que os fortalece e perpetua.
Pode acontecer do distímico ser melancólico e ficar choramingando pelos cantos o tempo todo ? Pode, não é tão comum, mas pode. É o perfil da pessoa amargurada, magoada com a vida, que anda com uma nuvem cinzenta sobre a cabeça, parecendo que o mundo deve a ela alguma coisa. A felicidade dos outros a incomoda (provoca inveja) e todas as atitudes positivas das pessoas é vista com desconfiança. Neste caso, ela usa a depressão para manipular e alimentar um ganho secundário importante: chamar a atenção sobre si. Precisa de atenção desesperadamente, mas finge que não se importa e sente um vazio muito grande, podendo ter um esquema de abandono hipercompensado (abandona o outro primeiro), isolamento social e/ou inibição emocional. O distímico antes de tudo é um hipercompensador, portanto, ele não sofre tão profundamente como o depressivo crônico, nem fica incapacitado. Ele trabalha normalmente e tem uma vida aparentemente "normal". Difícil é conviver com ele.
O Tratamento.
O deprimido ocasional, a princípio, não precisa de medicação nem de tratamento psicoterápico. Só de tempo e apoio emocional para digerir o que aconteceu e reestruturar a experiência por conta própria. Caso necessite de ajuda psicoterápica, a terapia será breve e o alvo focará na reestruturação cognitiva, mas recomendo que o trabalhado foque na cura do esquema que provocou a depressão. A Terapia do Esquema pode ser aplicada em qualquer caso ou diagnóstico, dos mais simples aos mais complexos e difíceis.
Em relação ao deprimido crônico, esse precisa tanto de medicação como, principalmente, de psicoterapia, no caso, a Terapia do Esquema. A medicação vai ajudar na estabilização para permitir que ele fique em condições de tirar proveito da terapia. O que a terapia do esquema faz é curar as feridas emocionais que geraram os esquemas, além de criar novas sinapses cerebrais onde o paciente terá uma resposta adaptativa e funcional às circunstâncias adversas de vida, prevenindo as recaídas, além da consequente mudança da auto imagem.
A abordagem cognitivo-comportamental tradicional (Beck) não funciona para esses casos de depressão crônica. A recidiva é de quase 70%. Não adianta reestruturar a tríade da depressão porque esquemas não são crenças. Esquemas são basicamente "memórias emocionais" que produzem reações inconscientes e automáticas na região do hipocampo no sistema límbico. Não há espaço para cognições nem pensamentos automáticos. Basicamente o paciente reage muito mal quando os gatilhos dos esquemas são ativados e nem sabe o porquê. A cognição é apenas uma parte da camada a ser trabalhada. Além disso, essas feridas emocionais ou frustrações podem ter sido causadas por abusos, privações ou maus tratos, razão pela qual o paciente reage aos esquemas como se os mesmos fosses traumas.
O trabalho com modos se encaixa perfeitamente neste caso de depressão crônica devido à complexidade, número de esquemas envolvidos e estilos de enfrentamento. A estratégia seria reestruturar os modos de enfrentamento desadaptativos resignados, alcançar a "criança vulnerável", fortalecer o "adulto saudável" e fazer a reparação parental quantas vezes forem necessários até a cura de todas a feridas e necessidades emocionais.
O distímico também se beneficiará muito da Terapia do Esquema, pelas mesmas razões do deprimido crônico. O desafio é o de convencer a aderir à psicoterapia. Como em geral ele hipercompensa os esquemas, não sofre visceralmente, mas sente a pressão desses esquemas e, principalmente, sofre as consequências do comportamento provocado pelos estilos de enfrentamento que servem como um paredão protegendo esses esquemas, que são a sua parte "criança vulnerável". Tudo no distímico é muito introjetado, recalcado e reprimido. Ele irá procurar a psicoterapia basicamente para lidar com as consequências do seu comportamento e do reflexo deste nos outros (familiares, amigos, profissão). Uma estratégia que eu uso com bastante eficácia é fazer um levantamento de vida, junto com o distímico, das consequências do seu comportamento. O quanto o comportamento distímico o fez perder ao longo de toda sua vida. Casamentos podem ter sido terminados, empregos perdidos, oportunidades desperdiçadas, isolamento e alienação, amizades muito restritas o quase nenhuma; com isso, fazê-lo enxergar o tamanho do prejuízo na sua vida. Fazê-lo lembrar também de situações bizarras e até engraçadas onde ele se comportou inadequadamente por conta do temperamento e da distimia. Isso ajuda a aumentar a autoconsciência e iniciar o processo de "desidentificação" com essa parte do ego. Em resumo, tudo isso ajudará esse paciente a fazer "cair a ficha" e finalmente aderir ao tratamento.
Espero que tenha gostado, o assunto é vasto e complexo, com certeza poderia me estender bem mais, mas tentei ser objetivo e esclarecer alguns pontos que, particularmente, vejo como importantes, além de enfatizar na sugestão psicoterápica na linha da Terapia do Esquema, que, na minha opinião, é a abordagem mais efetiva, eficaz e poderosa no campo da psicoterapia.
Se tiver sugestões de assuntos ou dúvidas sobre o tema, deixe o seu comentário.
Até o próximo post !
A despeito de existirem várias classificações de depressão, vou me fixar no meu ponto de vista acerca do tema onde os esquemas assumem um papel crucial e determinante.
Eu classifico basicamente a depressão em três vertentes : a depressão crônica, incapacitante, onde a pessoa já tem um histórico depressivo ao longo da vida, a depressão ocasional, "factual", engatilhada por uma circunstância externa, um fato ou uma experiência difícil de assimilar, entender, aceitar ou digerir emocionalmente, a pessoa da uma "balançada", há uma limitação psicológica momentânea que provoca a depressão, mas que, num tempo relativamente curto, no máximo em 3 meses, ela já começa a se recuperar e o mais importante, ela não tem recaída, o que passou, passou. E tem a distimia, que vem a ser uma alteração crônica de humor, onde a pessoa não necessariamente fica incapacitada, mas a qualidade de vida dela é afetada por essa condição distímica.
Tanto na depressão crônica como na distimia pode existir, muito provavelmente, uma comorbidade de natureza psiquiátrica, um desequilíbrio bioquímico cerebral, mas vou focar esse artigo, como já me referi, às causa psicológicas sob o ponto de vista da Terapia do Esquema.
A depressão crônica, onde o período depressivo em geral é extenso (mais de um ano com oscilações de intensidade), o indivíduo tem um histórico de quadros depressivos ao longo de toda sua vida, começando na infância, se intensificando na adolescência e passando a ser crônica na vida adulta, com raros períodos de intervalo, mas oscilando entre um quadro forte, incapacitante, até com internação, com períodos melancólicos em que não há necessariamente prejuízo funcional. Pode ocorrer, em casos de transtorno bipolar ou de personalidade borderline e até na esquizofrenia, uma condição em que as depressões crônicas surjam com mais intensidade já na vida adulta, em ciclos e atuando em comorbidade com as "viradas maníacas" (períodos de euforia), mas eu, particularmente, questiono essa premissa. Penso que nestes casos esses pacientes já apresentavam quadros depressivos e viradas maníacas na infância, mas que, provavelmente, foram subdiagnosticados ou subtratados.
Alguns classificam a depressão crônica como puramente biológica, no que eu também discordo. Mesmo que a causa primária seja efetivamente um desequilíbrio bioquímico cerebral, vai ocorrer a mesma situação como na ansiedade; independente desse desequilíbrio nos neurotransmissores ser uma herança genética ou uma doença congênita, esse quadro acaba se tornando um dos fatores decisivos na formação dos esquemas, ou seja, de qualquer forma, a criança que nasce com esse desequilíbrio bioquímico sofre influência dessa morbidade na construção da sua personalidade e temperamento. No caso do ansioso, ele se torna uma pessoa de personalidade fóbica e no caso do deprimido, a personalidade fica toda estruturada num padrão emocional melancólico.
Existem três esquemas que, ativados juntos, reforçados pelo temperamento, o qual determina o estilo de enfrentamento desses esquemas, provocam um quadro de depressão crônica e profunda; senão, vejamos: esquema de negativismo/pessimismo, onde a visão de mundo e de futuro é muito negativa e limitada. Esse esquema da uma sensação permanente de que nada vai dar certo, está tudo muito ruim e sempre estará. Não há esperança; esquema de defectividade, onde se concentra a chamada "baixa autoestima" e a autoimagem negativa. A pessoa com esse esquema nutre um sentimento de que é falho, sem valor, algumas vezes desprezível, podendo se sentir um "lixo"e por fim o esquema de privação emocional, onde há, inconscientemente, uma certeza de que não se é querido, não se é amado por ninguém e que ninguém se importa.
A pessoa com depressão crônica fica aprisionada nesses três fortes e enraizados esquemas. Ela não tem esperança no futuro, sente que não é amada por ninguém e que não tem valor algum. Ela sente que não nasceu nem merece ser feliz. Os esquemas se intensificam e se reforçam uns aos outros. O temperamento melancólico e resignado intensifica e reforça ainda o quadro. As ideações suicidas são muito frequentes. O risco de perpetrar o suicídio é alto.Formamos, com isso, um equação que explica a depressão crônica :
Esquema de defectividade + Esquema de negativismo/pessimismo + Esquema de privação emocional + Temperamento melancólico = Depressão Crônica
Na depressão "ocasional" ou "factual" pode acontecer da pessoa ter um desses esquemas o que já é condição suficiente para se deprimir (imagina com três esquemas ao mesmo tempo ! ), por exemplo, ela tendo um esquema de defectividade, ocorre um rompimento de relacionamento que ativa e intensifica sua baixa autoestima. Se tiver um temperamento melancólico e consequentemente uma resposta resignada, vai sofrer bastante, ficar na "fossa" e levar mais tempo para se recuperar, mas conseguirá se recuperar. Provavelmente precisará de ajuda psicoterápica para superar esse momento, mas mesmo que isso não aconteça, conseguirá se reerguer desde que não tenha os demais esquemas que formam a equação depressiva crônica. Na depressão ocasional a pessoa, a despeito de ficar bem abalada, não fica incapacitada. Consegue trabalhar (mal, mas consegue), se mantém relativamente funcional. Geralmente leva um mês ou 40 dias para começar a se recuperar. Passou de 40 dias e não se recuperou ou pelo menos começou a melhorar, deve se acionar o alerta para monitorar esse quadro depressivo. Se passar de três meses é necessária uma outra avaliação. Vale lembrar que nesses casos de depressão ocasional, a pessoa sai do quadro depressivo, mas ainda pode ficar "machucada" e a cicatrização pode levar anos, tal qual um processo de luto.
Quem tem os três esquemas (privação emocional, defectividade e pessimismo/negativismo) já tem histórico de depressões longas e fica extremamente suscetível a ter recaídas. A pessoa consegue se recuperar por algum tempo depois de um longo período depressivo, mas retorna ao quadro de depressão porque o padrão, o "normal" é ficar deprimido. Na verdade, esse período de recuperação é enganoso e passageiro, é apenas um intervalo entre uma fase depressiva e outra. Não representa uma melhora. A cura só virá quando forem tratadas as feridas emocionais que criaram os três esquemas, fora isso, tudo será apenas paliativo.
Existe uma outra condição depressiva que é chamada de "distimia". A distimia também é uma depressão crônica, mas com algumas diferenças. A pessoa distímica em geral não tem o esquema de defectividade, portanto, a sua autoimagem é relativamente boa. Na verdade, o distímico pode ter como esquema nuclear principal o negativismo/pessimismo. O que falta ao distímico é ESPERANÇA e CONFIANÇA no futuro e nas pessoas. Ele confia nele. Acha que o mundo funcionaria melhor se existissem pessoas com a mentalidade dele. Uma curiosidade é que o temperamento do distímico em geral não é melancólico. Ao invés de tristeza, o que ele nutre e sente na verdade é raiva na forma de ressentimento, intolerância, crítica e impaciência. Enquanto que o depressivo crônico acha que o mundo seria melhor sem que ele existisse, o distímico acha que ele ficaria melhor se todos sumissem do mapa. A culpa é dos outros, os outros é que enchem o saco dele. Essa visão de mundo denota um esquema de isolamento social ("não me encaixo nesse mundo nem me identifico com ninguém"), padrão inflexível (perfeccionismo) e inibição emocional ( falta de empatia com os outros).
O distímico é antes de tudo um mal humorado, ranzinza, azedo, amargo, um chato de galocha. Ele sofre ? Claro que sofre. Mas o sofrimento é reprimido, além dele hipercompensar e inverter o jogo. Ele provoca (projeta) nos outros os sofrimentos dos esquemas dele. O seu temperamento agressivo o ajuda a hipercompensar se colocando no polo oposto aos seus esquemas o que o faz se distanciar deles, mas ao mesmo tempo em que os fortalece e perpetua.
Pode acontecer do distímico ser melancólico e ficar choramingando pelos cantos o tempo todo ? Pode, não é tão comum, mas pode. É o perfil da pessoa amargurada, magoada com a vida, que anda com uma nuvem cinzenta sobre a cabeça, parecendo que o mundo deve a ela alguma coisa. A felicidade dos outros a incomoda (provoca inveja) e todas as atitudes positivas das pessoas é vista com desconfiança. Neste caso, ela usa a depressão para manipular e alimentar um ganho secundário importante: chamar a atenção sobre si. Precisa de atenção desesperadamente, mas finge que não se importa e sente um vazio muito grande, podendo ter um esquema de abandono hipercompensado (abandona o outro primeiro), isolamento social e/ou inibição emocional. O distímico antes de tudo é um hipercompensador, portanto, ele não sofre tão profundamente como o depressivo crônico, nem fica incapacitado. Ele trabalha normalmente e tem uma vida aparentemente "normal". Difícil é conviver com ele.
O Tratamento.
O deprimido ocasional, a princípio, não precisa de medicação nem de tratamento psicoterápico. Só de tempo e apoio emocional para digerir o que aconteceu e reestruturar a experiência por conta própria. Caso necessite de ajuda psicoterápica, a terapia será breve e o alvo focará na reestruturação cognitiva, mas recomendo que o trabalhado foque na cura do esquema que provocou a depressão. A Terapia do Esquema pode ser aplicada em qualquer caso ou diagnóstico, dos mais simples aos mais complexos e difíceis.
Em relação ao deprimido crônico, esse precisa tanto de medicação como, principalmente, de psicoterapia, no caso, a Terapia do Esquema. A medicação vai ajudar na estabilização para permitir que ele fique em condições de tirar proveito da terapia. O que a terapia do esquema faz é curar as feridas emocionais que geraram os esquemas, além de criar novas sinapses cerebrais onde o paciente terá uma resposta adaptativa e funcional às circunstâncias adversas de vida, prevenindo as recaídas, além da consequente mudança da auto imagem.
A abordagem cognitivo-comportamental tradicional (Beck) não funciona para esses casos de depressão crônica. A recidiva é de quase 70%. Não adianta reestruturar a tríade da depressão porque esquemas não são crenças. Esquemas são basicamente "memórias emocionais" que produzem reações inconscientes e automáticas na região do hipocampo no sistema límbico. Não há espaço para cognições nem pensamentos automáticos. Basicamente o paciente reage muito mal quando os gatilhos dos esquemas são ativados e nem sabe o porquê. A cognição é apenas uma parte da camada a ser trabalhada. Além disso, essas feridas emocionais ou frustrações podem ter sido causadas por abusos, privações ou maus tratos, razão pela qual o paciente reage aos esquemas como se os mesmos fosses traumas.
O trabalho com modos se encaixa perfeitamente neste caso de depressão crônica devido à complexidade, número de esquemas envolvidos e estilos de enfrentamento. A estratégia seria reestruturar os modos de enfrentamento desadaptativos resignados, alcançar a "criança vulnerável", fortalecer o "adulto saudável" e fazer a reparação parental quantas vezes forem necessários até a cura de todas a feridas e necessidades emocionais.
O distímico também se beneficiará muito da Terapia do Esquema, pelas mesmas razões do deprimido crônico. O desafio é o de convencer a aderir à psicoterapia. Como em geral ele hipercompensa os esquemas, não sofre visceralmente, mas sente a pressão desses esquemas e, principalmente, sofre as consequências do comportamento provocado pelos estilos de enfrentamento que servem como um paredão protegendo esses esquemas, que são a sua parte "criança vulnerável". Tudo no distímico é muito introjetado, recalcado e reprimido. Ele irá procurar a psicoterapia basicamente para lidar com as consequências do seu comportamento e do reflexo deste nos outros (familiares, amigos, profissão). Uma estratégia que eu uso com bastante eficácia é fazer um levantamento de vida, junto com o distímico, das consequências do seu comportamento. O quanto o comportamento distímico o fez perder ao longo de toda sua vida. Casamentos podem ter sido terminados, empregos perdidos, oportunidades desperdiçadas, isolamento e alienação, amizades muito restritas o quase nenhuma; com isso, fazê-lo enxergar o tamanho do prejuízo na sua vida. Fazê-lo lembrar também de situações bizarras e até engraçadas onde ele se comportou inadequadamente por conta do temperamento e da distimia. Isso ajuda a aumentar a autoconsciência e iniciar o processo de "desidentificação" com essa parte do ego. Em resumo, tudo isso ajudará esse paciente a fazer "cair a ficha" e finalmente aderir ao tratamento.
Espero que tenha gostado, o assunto é vasto e complexo, com certeza poderia me estender bem mais, mas tentei ser objetivo e esclarecer alguns pontos que, particularmente, vejo como importantes, além de enfatizar na sugestão psicoterápica na linha da Terapia do Esquema, que, na minha opinião, é a abordagem mais efetiva, eficaz e poderosa no campo da psicoterapia.
Se tiver sugestões de assuntos ou dúvidas sobre o tema, deixe o seu comentário.
Até o próximo post !
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